sábado, 1 de março de 2014

Diário de Caminhada - ETAPA XV: Guimarães - Braga

Diário de Caminhada - ETAPA XV:  Guimarães - Braga

“Da nossa casa a Santiago de Compostela”,

Etapa XIV: Guimarães - Braga
12 de Janeiro de 2014, domingo

Caminhantes: Anselmo, Benvinda Monteiro, Carlos Matos, Fernando Gaspar, Fernando Micaelo, Guida Mendes, Jaime Matos, Joaquim Branco, Luisa, Paula Marques, São Branco, Zé Manel Machado. No apoio, Piedade.

Sinopse:

Inicio em Guimarães: 08:50 horas
Chegada a Braga (Sé): 15:12 horas
Distância percorrida: 22,5 km
Tempo total de caminhada: 06:22 horas
Tempo parado: 01:02 minutos
Velocidade média: 4,2 km/h

Povoados e locais de referência ao longo do percurso: Guimarães, Ponte de Roldes (Fermentões), Caldas das Taipas, estrada romana Falperra, Igreja de Santiago (Fraião), Braga.

Acumulado:
Caminho: 369,2 Km
Bacias hidrográficas: Tejo, Zêzere, Mondego, Távora, Varosa, Douro, Tâmega, Vizela/Ave.
Distritos: Castelo Branco, Guarda, Viseu, Vila Real, Porto.
Concelhos: Castelo Branco, Fundão, Covilhã, Belmonte, Manteigas, Guarda, Celorico da Beira, Trancoso, Aguiar da Beira, Sernancelhe, Moimenta da Beira, Tarouca, Lamego, Peso da Régua, Mesão Frio, Baião, Amarante, Felgueiras, Fafe, Guimarães, Braga.

Fonte: GPS de Joaquim Branco
(ver track aqui)

A partilha de espaços de descanso nocturno tem riscos para os que são mais atreitos à insónia. Se calha haver um (ou mais) que, não sofrendo desse mal, fazem do ronco a banda sonora dos seus sonhos, as noites tornam-se longas e penosas para os outros. Foi o caso, e ocorreu desta vez no Hostel que abrigou estes humildes peregrinos situado em plena praça de Santiago, ali arcadas meias com o largo da Oliveira.



E o caso fica soberbamente ilustrado com a ajuda do mestre Aquilino, n’A Casa Grande de Romarigães quando descreve, como só ele é capaz, o problema do personagem Luís Azevedo quando em viagem por estas mesmas bandas, quiçá percurso igual, encontrou guarida no convento de S. Gonçalo em Amarante numa cela ao lado do seu companheiro Padre Tirteu, depois de já ter aguentado uma noite em claro em Guimarães. Ora, aprecie-se como Aquilino nos sensibiliza para a sua agonia nocturna:

“O diabo é que ele ressonava mais alto, variado e plangente que o órgão na vigília da Paixão. Fosse obra de esturrinho, com semiobstrução das fossas nasais, o certo é que dentro daquelas ventas monásticas ora mugiam dez gaitas de foles galegas, ora assobiava a gaitinha de palha mofareira que os rapazes fazem do trigo a apendoar. A partitura entrecortava-se de solos que estrugiam pelo claustro e deviam, transbordando para o exterior, extasiar céu e terra. Quando no decorrer dum piano pianíssimo, que também tinha dessas variações a trompa prodigiosa, Luís Azevedo conseguia pregar olho, de repente soltava ela um larghetto, com notas de oboé e rabecão, e lá se ia o regalado soninho. Às seis horas da manhã, quando começou a luzir a claraboia e um cochicho veio para os loureiros soltar a sua solfa, ainda andava ele aos tombos com o travesseiro.”

A boa disposição matinal do grupo e o pequeno almoço farto (ver cardápio da etapa anterior) no hostel, ajudaram a espevitar os mais infelizes. Acondicionados os bornais no autocarro, despedimo-nos da praça do nosso orago caminhante às 08:50. A chuva miudinha, tipo moinha, aconselhou o poncho impermeável que não mais largaríamos durante toda a etapa. Desde a Gardunha, no ido mês de Novembro de 2012, que não se apanhava um dia como este, molhado e ventoso. Bravamente, os peregrinos não se detiveram perante tal minudência e atacaram o caminho, cuidando apenas em rodear os lapacheiros.



O Minho, aquele Minho cuja imagem se alojou no nosso álbum fotográfico mental tem vindo a sofrer actualizações ao longo do caminho, muito por via do caos urbanístico que se impõe na paisagem, sobretudo desde as imediações da Lixa. A variedade cromática em torno do característico verde do Minho é selvaticamente agredida pela salganhada de cores e azulejos nas milhentas casas semeadas ao desbarato na paisagem. O caminho alterna entre veredas rodeadas de verdes, vinhas altas e ruas mal alcatroadas. O primeiro ponto digno de interesse é a ponte de Roldes em Fermentões. Era domingo de manhã, o povo religioso apresentava-se aperaltado para a missa. Meia hora mais à frente o rio Ave surge algo agitado, nas Caldas das Taipas, onde a velha ponte mal tapa o leito.

A chuva faz-se sentir cada vez mais forte, obrigando os peregrinos a ajustarem capas e ponchos. Até ao alto da Falperra, o percurso faz-se em caminho empredrado, supostamente uma estrada romana, muito maltratada, rodeada por uma incaracterística floresta de eucaliptos.



Já se vê Braga lá em baixo. Descida por trilhos pejados de troncos de eucaliptos até Fraião, onde a Igreja de Santiago exibe um bonito painel de azulejos. Pediram os peregrinos licença e o Santo concedeu a graça de fotografia enquadrada pela sua figura.


Por Braga adentro, cruzando o campo de Santiago, fim de etapa na Catedral de Santa Maria de Braga, passava um quarto de hora das 3 da tarde.